11/02/2010

A televisão mostrava a cidade, suas ruas movimentadas iam sendo cruzadas, como se observadas por alguém que é carregado por um veículo, sem a preocupação em dirigi-lo, alguém que é apenas levado. Não se ouvia o barulho real da cidade, apenas uma música melancólica, que servia de trilha sonora para aquele mundo de concreto e gente.



Estranho. Notou que o passar dos dias causava-lhe a mesma sensação que o cinema tentava reproduzir na TV. Os dias passavam, cinzas e musicados.


Em certos momentos algumas janelas se abriam e ele entrava. Sabia que sua permanência ali seria temporária, mas alegrava-se por entrar. Uma vez lá dentro podia falar, beber, trabalhar, transar e sorrir. Porém, a mesma alegria que lhe proporcionava a passagem para fora era sentida na sua inevitável fuga de volta para dentro. Alguns poderiam comentar sobre sua alegria, nomeá-la “felicidade de transição”, e não estariam errados. Mas os dois mundos também o agonizavam, em muitos momentos se tornavam intoleráveis, nessas horas seus sentidos o machucavam, especialmente a audição – o barulho se tornava insuportável.


Os do lado de fora tinham dificuldade em compreender porque os mesmos sons que, até então, haviam embalado sua dança já não eram mais suportáveis; e estranhavam suas fugas repentinas.


Apático ele via a cidade, suas ruas movimentadas iam sendo atravessadas, observadas por alguém carregado por um veículo sem a preocupação de dirigi-lo, alguém que é apenas levado. Não escutava o barulho real da cidade, apenas sua própria música, melancólica, maléfica e veloz, que servia de trilha sonora para seu mundo de sombras.

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